Internacionalmente conhecida por sua arte política relacionada, principalmente, com a promoção dos direitos das mulheres, Panmela Castro é uma artista brasileira cuja prática artística é movida por relações de afeto e alteridade.
A partir da ideia de “deriva afetiva”, ela propõe o acaso como sujeito de uma busca incessante pelo sentimento de pertencimento. Baseada no pensamento da performance, sua produção artística converge em trabalhos que permeiam pintura, escultura, instalação, vídeo e fotografia.
É formada em pintura pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (2007), mestre em Processos Artísticos Contemporâneos pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2011) e e é pós-graduanda do curso de Direitos Humanos, Responsabilidade e Cidadania Global pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2023).
Seu trabalho faz parte de coleções internacionais, incluindo Stedelijk Museum e ICA Miami, além de importantes coleções do Brasil como Instituto Inhotim, MASP, Pinacoteca do Estado de São Paulo, Museu Nacional de Belas Artes e Museu de Arte do Rio. Entre as suas exposições mais recentes e dignas de nota, participa atualmente na exposição de longa duração no Museu Stedelijk intitulada “Tomorrow is a different day - 1980 up to now”; participou da Bienal das Amazônias (Belém, 2023); “Dos Brasis: Arte e Pensamento Negro” no Sesc Belenzinho (São Paulo, 2023); “Ana Mendieta: Terra Abre Caminhos” no Sesc Pompeia (São Paulo, 2023); “Funk” no MAR (Rio de Janeiro, 2023); “Histórias Brasileiras” no MASP (São Paulo, 2022); “Quilombo: vida, problemas e aspirações do negro” no Instituto Inhotim (Brumadinho, 2022); Bienal do Mercosul (Porto alegre, 2022); “Um Defeito de Cor” no MAR (Rio de Janeiro, 2022); “Negros Na Piscina” na Pinacoteca do Estado do Ceará (2022); “Brasil Futuro: as formas da democracia” no Museu Nacional da República; “Enciclopédia Negra” na Pinacoteca de São Paulo (2022) e MAR (2021); “Escrito no Corpo” na Tanya Bonakdar em Nova York (2022) e Carpintaria (2021); bem como as exposições individuais “Deriva Afetiva Dakar”, Instituto Inclusartiz (2023); “Ostentar é Estar Viva” na Galeria Luisa Strina (2021) e “Retratos Relatos” que teve sua primeira montagem no Sesc Paraty em 2023 e rodará o Brasil como um projeto do Sesc Nacional pelos próximos 10 anos.
Em “Retratos Relatos", dez mulheres de diferentes territórios do Brasil se encontraram com a artista Panmela Castro para compartilhar suas histórias e denunciar a violência doméstica no Brasil. Com histórias, origens e
experiências diversas, essas mulheres retratadas expuseram ao público suas jornadas de enfrentamento ao machismo e à violência. Como protagonistas de suas histórias, suas vivências transcendem o individual, subvertendo essa dor ao abrir espaço para outros significados e inspirações. As obras deste projeto foram criadas ao vivo no Sesc Santa Rita, em Paraty-RJ, durante junho de 2023. Enquanto as mulheres retratadas posavam para a artista, o público presente na galeria testemunhava o processo criativo. Assim, os retratos ganharam vida através das pinceladas rápidas e vigorosas da artista, capturando a essência desse encontro único. Cada pintura e relato abordam dez temas essenciais para a compreensão da formação da violência doméstica em nossa sociedade. História das mulheres, construção de gênero, machismo estrutural, os cinco tipos de violência (psicológica, moral, física, sexual e patrimonial), a Lei Maria da Penha e o serviço Ligue 180 são os principais focos da exposição, bem como de uma websérie educativa em desenvolvimento.
Panmela Castro, ativista social e protagonista da quarta onda feminista, conforme descrito por Heloisa Buarque de Holanda em "Explosão Feminista" é a fundadora da organização sem fins lucrativos Rede NAMI. Seu trabalho coletivo em prol dos direitos das mulheres e no enfrentamento à violência doméstica impactou mais de 200 mil pessoas na última década.
Pelos seus esforços notáveis nesta área dos direitos humanos, recebeu inúmeras distinções, incluindo a nomeação de Young Global Leader pelo World Economic Forum, o DVF Award e a inclusão na lista das 150 mulheres corajosas que estão transformando o mundo, pela renomada revista norte-americana Newsweek.
A DOMI Galeria de Arte Online fez uma entrevista exclusiva com Panmela e aqui está o resultado:
Seu currículo é bastante extenso e de tirar o fôlego! Mas quem é exatamente Panmela Castro ou como vc se auto definiria?
Eu me defino como uma andarilha. Eu vivo nessa deriva me deixando levar pelas conexões de afeto que crio nos lugares por onde passo. Procuro meu lugar no mundo e onde eu possa ser aceita, cuidada e amada. E isso também se reflete na minha arte.
Fale um pouco sobre seu trabalho hoje, enquanto mulher artista e feminista
Eu me considero uma feminista interseccional e procuro contribuir com as mudanças que nós mulheres, cis e trans, precisamos para melhorar nossa qualidade de vida. Um exemplo é a epidemia de violência doméstica que vivemos hoje. Uma mulher se torna vítima de violência doméstica a cada 4 horas no Brasil, segundo dados do boletim “Elas Vivem: dados não se calam” da Rede de Observatórios da Segurança, de 2023. Então eu procuro usar a minha arte e visibilidade para tratar sobre esses assuntos, contando a minha própria história, contando a história de outras mulheres e inspirando jovens meninas, num esforço maior de sermos nós as protagonistas de nossas próprias narrativas. Ser mulher é lindo, mas pode ser muito mais.
Quais suas maiores influências ou quais foram suas grandes referências?
Como eu estudei na universidade, eu recebi uma educação formal, baseada na história da arte tradicional, que é branca e europeia. Então muitas das influências em minha arte vêm dessas referências, como Chris Burden, Sophie Calle e Tracey Emin. Mas para compensar essa perspectiva limitada, busco inspiração nas pessoas que fazem parte da minha vida e com quem compartilho experiências intelectuais. Essas pessoas são Rafael Bqueer, Rosana Paulino, Ayrson Heráclito, Regina José Galindo, Carlos Martiel, e muitos outros colegas que me inspiram diariamente.
Que conselho que vc daria para alguém que está começando agora e tb para artistas de um modo geral? Se vc conseguisse resumir todo o seu aprendizado ao longo da sua carreira, oq vc acha que seria interessante ou útil ter sabido antes?
Todo o conhecimento que acumulei ao longo de mais de 20 anos de carreira foi condensado em um manual direcionado a jovens artistas. Este manual, intitulado 'Hackeando o Poder – Táticas de Guerrilha para Artistas do Sul Global', foi publicado pela Editora Cobogó em 2023. Idealizado por mim e executado em colaboração com a Rede NAMI, ele é resultado do trabalho conjunto de mais de 50 pessoas, incluindo artistas, curadores, profissionais da arte e dos direitos humanos, além da minha própria equipe na Rede NAMI. No manual, apresentamos verdadeiras estratégias de guerrilha para aqueles que desejam entrar no mundo da arte, reconhecendo que as oportunidades não são iguais em uma sociedade marcada pelo patriarcado, buscamos incentivar a independência - principalmente financeira - como forma de enfrentá-lo, através das muitas ferramentas existentes no mundo atual e das experiências de quem já passou por esses processos. Meu conselho geral é que sempre estabeleça suas metas, una forças com suas aliadas e desenvolva estratégias para alcançar seus objetivos. Aproveite as brechas para ocupar os espaços de poder que foram negados a você em um mundo marcado pelo machismo, racismo e preconceito. Se você não souber como chegar lá, não hesite em pedir orientação a quem já trilhou essecaminho. Uma vez lá, descolonize essas estruturas para que outras também possam chegar junto; somente assim poderemos construir um mundo mais justo.
Onde mais vc quer chegar? Todos nós, de uma forma ou de outra, perseguimos nossos objetivos diariamente, temos nossos projetos, nossos desejos... Mas alguns têm também um grande sonho, uma grande meta, qual seria a sua?
Minha meta pessoal é alcançar um fim de vida digno, com qualidade e felicidade. No âmbito profissional, seria gratificante ter a relevância do meu trabalho reconhecida, documentada e lembrada. Em termos de ideais, almejo concluir o trabalho da NAMI com a realização daquilo que sempre buscamos: uma sociedade livre de violência.